sábado, 12 de setembro de 2020

“Enquanto engoma a calça” de Ednardo. O maranhense Chico me apresenta ao som do Ceará.

Que os cearenses chegaram pra ficar o Brasil inteiro ficou logo sabendo. Eles não eram só bons humoristas. Eram bons também de viola. Em compor nem se fala.

Após passar no concurso para o Banco do Brasil e ser motivo de admiração e respeito pelo esforço dos familiares, meu primo Chico de Caxias passou um tempo perambulando por agências do Maranhão e foi parar no Ceará.

Com o tempo trocou o “éguas” dos maranhenses por “macho” dos cearenses.

No Maranhão os cearenses já eram conhecidos e admirados pelo talento. Belchior e Fagner já tomavam conta das poucas rádios de São Luís e nos bares os seresteiros iniciavam logo o repertório com eles pra fazer bonito.

“Comentários a respeito de John” e “Canteiros” já estavam nos ouvidos dos amantes do happy hour da época. Sacramentaram presença cearense não só na noite maranhense, mas no país inteiro. “Na hora do almoço” e “Conflito” já eram consagradas desde a época que morei no Rio em 1976.

Em 1983 fiz uma passagem rápida por Fortaleza a convite do primo Chico. Ele estava lá a trabalho e o principal lazer era ir para o clube social dos funcionários do banco nos finais de semana dançar e ouvir boa música. Fã confesso de Gonzaguinha pedia sempre para puxar na viola uma de suas músicas. “Sangrando” o fazia chorar e lembrar do Maranhão. Não sei o lado afetivo dessa canção com o primo. Uma paixão ou simples saudade da terrinha. Isso ele nunca me falou. Só sei que o rapaz cantava a música trabalhada nas lágrimas.

Mas além do compositor carioca que ele gostava apresentou-me outro cearense. Eu disse: mais um. E o cara era bom mesmo. Era o Ednardo de “Terral” e que já tinha feito trilha até para uma novela global: “Pavão Misterioso”.

A canção produzida em 1979 deslizou no vinil da sala em Aldeota com um gostoso violão fazendo ponte e percussão a gosto. O som cearense assim chegou:


“Arrepare não , mais enquanto engoma a calça

Eu vou lhe contar uma história bem curtinha fácil de cantar

Porque cantar parece com não morrer

É igual a não se esquecer que a vida aqui tem razão.

 

Esse voar maneiro foi ninguém que me ensinou

Não foi passarinho foi o olhar do meu amor

Me arrepiou todinho e me eletrizou assim

Quando olhou meu coração...”

Gostei demais e falei pro Chico que aquela já estaria no próximo repertório. Cantamos juntos a noite inteira e depois nas Praias do Náutico e de Iracema pude perceber como eles valorizam seus artistas. Nos violões das calçadas as moças cearenses cantarolavam ao sabor do chopp geladíssimo e da farta gastronomia local sua música sem súplica.

Na rodoviária, rápida despedida. O primo agradeceu a visita. Rumei para o Rio.

Caminhando por Vila Isabel escuto de um som potente vindo de um alto falante uma canção:

 

“Amanhã se der um carneiro, carneiro

 vou me embora daqui pro Rio de Janeiro...”

Pensei: serão os cearenses? E era. Eles atacavam de novo. Liguei pro Chico e avisei: adivinha quem desembarcou no Rio?  Ele respondeu rápido interrogando: Ednardo? Pensei: ele já sabia. 

Paço do Lumiar(MA) domingo 21 de junho de 2020 às 19h03min09s

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