sábado, 25 de julho de 2020

A mais bela “Conceição”. Cauby Peixoto.

Quando um dos integrantes do MPB-4 anunciou o seu nome o público já poderia esperar o melhor. Um dos grupos vocais mais importantes e dos mais talentosos do país completava 40 anos de estrada e trazia convidados para a festa. Um deles era muito especial.

Anunciado, o convidado lentamente apareceu, aproximou-se e de microfone em mãos destacou:

— Esta é a Conceição mais linda da minha vida e será.

O afinadíssimo quarteto atacou e num fá maior os acordes iniciais do violão introduziram:

 

“Conceição eu me lembro muito bem, muito bem

Vivia no morro a sonhar, vivia a sonhar

Com coisas que morro não tem, que o morro não tem não, não tem

Foi então, foi só então, que lá em cima apareceu

Alguém que lhe disse a sorrir que descendo a cidade

Ela iria subir...”

 O mestre do canto convidado completou com classe e elegância antecipado de um belíssimo bandolim:


“Se subiu ninguém sabe, ninguém viu

Pois hoje seu nome mudou

E estranhos caminhos pisou

Só eu sei que tentando a subida desceu

E agora daria um milhão para ser

Outra vez Conceição, Conceição, Conceição.”

Era Cauby Peixoto. O público foi ao delírio, eu às lágrimas. De fato aquela era a Conceição mais bela que já ouvi alguém cantar. A impressão que tive que estava diante de um dos momentos ímpares da música brasileira. O tempo da canção não chega a três minutos e foi o suficiente para ficar na minha memória feito tatuagem como na canção de Chico Buarque.

Não sei se Cauby e o grupo MPB-4 voltaram a se encontrar em palcos brasileiros, pois já com certa idade o mestre do canto já sentia a força do tempo. Cheguei a vê-lo cantando sentado sem força nas pernas, mas não na voz. Isso o tempo não lhe tirou: continuava afinada e com o mesmo vigor de outrora. Um dia sua bela voz se calou, mas não precisou de nenhum milhão para ser outra vez o Cauby de toda Conceição ou a Conceição do Cauby.

Conheci muitas damas de nome Conceição e não poderia supor que um dia me casaria com uma. Eu me casei com a mais bela de todas.

Paço do Lumiar (MA), sexta-feira, 19 de junho de 2020 às 03h09min57s


2 comentários:

  1. Olha só, mais uma crônica que li, comentei e o meu comentário não foi publicado. Essa já li na quinta-feira, a tarde, logo depois do almoço. Vamos lá, tentar reproduzir o que senti no momento da primeira leitura.
    Cauby Peixoto foi mais um intérprete maravilhoso, de belíssima voz e com um jeito todo especial de interpretar suas canções. Conceição é uma música muito especial em nossa família, minha mãe adorava. É como não gostar, numa família repleta de Conceições, afinal éramos 4, além do fato de Cauby haver a eternizado com sua belíssima interpretação. A música conta a história de uma jovem comum é inocente, que vivia com simplicidade e sonhava com uma vida mais digna e confortável. Na época eu ainda era muito jovem e também inocente, uma das Conceições da família que também gostava de ouvir a canção, talvez por ver a mãe cantarola-la e por se sentir um pouco homenageada também. Mas hoje, já com outra visão do mundo e calejada pelos altos e baixos da vida, já interpreto a bela canção como a história de mais uma menina, como muitas outras, que em busca de uma vida mais digna, se lançou no mundo em buscas de seus sonhos, e certamente precisou passar por diversas situações que não imaginava para conseguir se posicionar na vida.

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  2. Certamente a Dayse mais madura entendeu o que aquela Dayse mais jovem sonhava. Conceição retrata a luta feminina por um lugar ao sol. Cauby interpretou muito bem a luta que toda menina Conceição tem que enfrentar para ter o seu espaço numa sociedade ainda infelizmente marcada pelo machismo que nãi quer aceitar a constante evolução feminina em todos os setores.

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